Na nossa viagem conhecemos gente interessantíssima.
Estivemos com o Hamilton Coelho.
Figura fantástica!
Não me conformo até hoje por não havê-lo "descoberto" antes.
Perdi a conta de quantas vezes já cruzei a fronteira Brasil-Uruguay pela pequena ponte sobre o arroio chui, e nunca soube que bem ali ao lado vive uma personalidade tão interessante.
Ele mora a bastante tempo em uma casa ampla às margens do arroio chui.
O terreno pertence ao estado, e a casa foi construída pelo governo militar, mas muito pouco usada, e acabou sendo abandonada, e o Coelho aguarda com paciência o judiciário definir sua situação de posse.
Enquanto isso...
Ele dá vasão à sua arte e alimenta sua paixão pelo mar e suas coisas.
Baleias.
É pelo trabalho que faz com os ossos destes animais que ele se tornou conhecido.
A extensa (220km) praia que vai do Chui a Rio Grande é o seu quintal, e a vertente tanto inspiradora quento de matéria-prima para seu trabalho.
Quem passar pela fronteira sul do país não pode deixar de conhecer o Coelho, que se intitula o último morador do Brasil, mas que eu digo que não é o último não, mas o primeiro!
Outra pessoa singular que conhecemos foi a Rosario, ou "la flaca", ou "Rosita la fletera", apelidos pelos quais é conhecida em La Pedrera.
Rosario é uma argentina de meia idade que trabalhou por vários anos na área de marketing da Intel, e que após o término de seu casamento disse: o que eu estou fazendo aqui?
Largou a vida estável e saiu por ai.
Rodou toda a América do Sul e depois de ver e conhecer o que queria, acabou baixando âncora em La Pedrera.
Você pode encontrá-la todas as noites no restaurante Don Rômulo, onde trabalha de garçonete, e de dia ela faz fretes com uma van.
Na primeira noite que fomos ao restaurante ela estava sozinha no atendimento, e comentou: "estamos un poquito colapsadas", mas percebeu que as músicas não estavam muito "sintonizadas" com com o público e lançou: "vamos a musicalizar el ambiente!"
Quando pedíamos dicas sobre o cardápio ela disse "acá se come bien. Trabajo a un mes y medio y ya engordé un quilo!", e nos recomendou os Tortelones de carneiro ao molho de butiá, que é realmente muuuuuuito bom!
"Colapsada" ela percebeu que não havia guardanapos disponíveis, mas não se abalou. Foi à cozinha e pegou duas toalhas de papel: "se nos terminaron las servilletas, pero te traigo toallitas de papel para que te sientas en casa".
Quando a Carla pediu uma única sobremesa e duas colheres, ela me olhou e largou: "estás de acuerdo con eso?"
Ao vermos um cartazinho de WI-FI perguntamos pela senha, Rosario explicou: "está escrito, pero es mentira, no tenemos wi-fi, pero en el club de la esquina... la seña es..."
Ela brinca e diz que sempre que cruza com um cavalo puxando as tradicionais carroças de frete, sente um tipo de remorso por estar tirando o trabalho dos bichos.
E pra fechar as personalidades da fronteira, conhecemos Don Eusebio, que trabalha como jardineiro, eletricista, encanador, marceneiro, e o que mais for necessário no Pueblo Barrancas.
Quando viu que havíamos terminado o café da manhã, se acercou para enrolar seu cigarro de palha e "gastar um pouco as palavras". Acabamos filosofando sobre o mate (chimarrão), seus rituais, papel social, e psicológico, e neste lento diálogo ele sentenciou: "el mate tiene que tener su pausa, si no és água caliente".
Só com esta frase e uma boa garrafa de vinho, passa-se uma noite inteira filosofando sobre a vida!
Até o próximo!
Um comentário:
Conhecer lugares é legal.
Conhecer sabores é melhor ainda.
Mas conhecer gente, realmente tem um gostinho especial.
Nâo conhecer pessoas. Gente, mesmo. Entender a vida do cara, tirar o chapéu pra ele, olhar pra nossa vida e pensar "como é simples!".
A maior viagem de todas, geralmente é aquela pra dentro de nós mesmos! Posts tão raros, mas ótimos! Abraços!
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